quarta-feira, fevereiro 07, 2007

 

 

Entrevista

Há uns tempos atrás, neste mesmo blog fui abordado por um grupo de estudantes de Sociologia da Universidade do Algarve para colaborar num estudo que estavam a fazer no âmbito de uma cadeira do curso de Sociologia. Como também sou estudante universitário e bem sei o que por vezes custa realizar certo tipo de trabalhos que exigem muita pesquisa, imediatamente me prontifiquei a ajudar, ainda para mais tendo em conta que o assunto principal era o Surf - exactamente aquilo que move a existência deste blog e salvo as devidas proporções que move a minha vida também!

Após alguma troca de mails foi-me realizada uma entrevista por escrito, à qual tive o maior gosto em responder.

Hoje recebi a apresentação do trabalho final realizado por estes alunos e também a autorização para poder publicar a entrevista no blog, a qual tinha sido solicitada por mim há algum tempo.

Assim, neste contexto, transcrevo a entrevista e as respostas dadas por mim, na tentativa de mais uma vez, e de uma forma diferente exprimir aquilo que o surf é na minha vida!

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  1. O que te motivou a praticar Surf?

Foi um pouco um vazio que existia em mim, enquanto puto, que me impelia a tentar ser algo de diferente. Começou como uma mania de puto, uma mania irrealista, dado o contexto em que vivia (Évora) que ao longo dos anos se foi adensando até se tornar num vicio, e mais recentemente em algo absolutamente impregnado na minha maneira de ser, e no modo como encaro a vida

  1. E o que te continua a motivar para continuares a praticar?

Acho que no surf, a motivação advém da experiência que se retira dentro de água. Há obviamente aquela motivação, aquela pica quando se nota evolução numa qualquer manobra ou no nosso surf de uma forma global, e que nos impele a cada vez se querer surfar mais. No meu caso, e dada a minha condição de residente em Évora, isto continua a ser válido, mas de uma forma muito mais dramática. Surf para mim é poucas vezes ao ano, e neste momento, o que talvez mais me motive a continuar a praticar é saber que no futuro certamente terei melhores condições para o praticar, saber que um dia provavelmente poderei entrar no mar todos os dias, quando bem entender. Até lá continuo a disfrutar intensamente de cada surfada que dou de tempos a tempos.

  1. Alguém da tua família ou amigos praticaram Surf? Houve alguém que te influenciou a praticar?

Não. Ninguém da minha família surfa, por razões obvias. Amigos também não, no entanto já fiz amigos no surf. Ninguém me influenciou a praticar, foi um “vipe” que se transformou numa paixão.

  1. Praticas mais algum desporto náutico? Se sim, qual?

Não.

  1. Qual a influencia do Surf no teu quotidiano? Modificaste alguns dos teus hábitos depois de iniciares este desporto?

Como já disse, vivo e estudo em Évora, o que me dificulta a tarefa de surfar regularmente. Neste momento o surf no meu quotidiano funciona ainda que a nível mais espiritual como um tónico, uma espécie de objectivo a alcançar, uma espécie de amor platónico só ocasionalmente correspondido com amor carnal.

Depois da primeira surfada, depois de estarmos completamente ligados ao surf, é inevitável alguma mudança na nossa maneira de estar na vida. Não considero que tenha havido hábitos específicos que tenha alterado, penso que tem sido um processo natural, onde talvez a face mais visível sejam as constantes possibilidades de ir ao mar e tudo o que daí advém em termos de rotina diária.

  1. Fazes algum tipo de exercício físico regular para te preparares fisicamente para o Surf?

Infelizmente não o faço, sabendo e tendo consciência que o devia fazer. A universidade toma-me a maior parte do meu tempo, além de outras actividades nas quais estou envolvido. Não sendo desculpa, a verdade é que nada disto facilita. Mas de quando em vez dou umas corridinhas, uma natação e mais frequentemente umas futeboladas para descomprimir com os amigos.

  1. Em que locais costumas praticar Surf?

Inicialmente surfei muitas vezes em S. Torpes, Sines. Na verdade iniciei-me em Odeceixe, sendo que as primeiras praias onde surfei foram Praia da Luz (Lagos) e Arrifana (Aljezur).

Mais recentemente, vou alguma vezes para a Costa da Caparica e Fonte da Telha.

  1. Já participaste em campeonatos? Costumas participar?

Lol, nem pensar!! Não sou competitivo por natureza e nem o meu nível mo permite.

  1. Quanto tempo dedicas a praticar Surf?

Ui... muito menos do que desejaria. Mas lá está, o surf não se resume, em minha opinião, a um desporto. É antes de mais um estado de alma.

  1. És apologista do Surf Profissional?

Não sou contra. Mas como disse, a minha natureza muito “espírito livre” e nada competitiva leva-me a olhar o surf profissional, que está intimamente ligado ao surf competição, de uma forma desinteressada. Acho no entanto, e concebo perfeitamente, que o surf enquanto desporto profissional proporciona ao surfista uma vida que muitos desejariam: surfar as melhores ondas do mundo e ser pago para isso. Também é óbvia a contribuição do surf profissional para uma evolução técnica do surf ao longo dos anos, bem como da acessibilidade a novos e melhores materiais para a prática do surf. O problema é que nem sempre o surf profissional/competição são o melhor veiculo de transmissão daqueles que para mim, são os verdadeiros ensinamentos a retirar do surf enquanto estilo de vida.

  1. Já fizeste alguma Surf Trip?

Sim, pode-se dizer que sim. Costa alentejana algumas vezes.

  1. Podemos afirmar que na sociedade existe a ideia de um estilo muito próprio dos Surfistas, o tipo de cabelo loiro, com aspecto descontraído, entre outras caracterizações. Identificas-te com alguns desde estereótipos? Que pensas desta ideia generalizada?

Não me identifico minimamente com qualquer estereótipo do surfista que eventualmente possa existir. Acho até que o tipo cool de cabelo descolorado e pele queimada não é hoje em dia já tanto utilizado como caracterizador do surfista. Acho que a esse nível, em Portugal já existe uma consciência mais generalizada de que o surfista é o engenheiro, o advogado, o pedreiro, o pintor, o arquitecto, o canalizador, seja lá o que for, cada um com a sua maneira de ser, vestir, estar. Se existe eventualmente ainda em algumas pessoas, essa concepção da imagem do surfista, penso que é um pouco antiquada e desactualizada e corresponde pouco à verdade, porque ser surfista é uma condição essencialmente interior, ainda que exteriormente e como em tudo na vida, seja passível de ser extravasada.

  1. È também costume afirmar que o Surf é algo mais que um desporto, é um estilo de vida. Sentes isso como tal? Porquê?

Acho que as minhas respostas anteriores já responderam a isso. O surf é mais do que um desporto. É uma forma de estar na vida, um estado de alma, uma forma de encarar a existência, o mundo. É essencialmente um acto hedonístico de comunhão com a Natureza, onde nos sentimos verdadeiramente livres, física e mentalmente. É quase uma terapia, como eu já disse algumas vezes, o surf não se explica, sente-se, ainda que isto possa parecer um cliché, é a mais pura das verdades.

  1. Se tivesses de definir o que é o mar, como o farias?

Liberdade. É engraçado que eu sinto-me aprisionado aqui onde vivo por olhar para todos os lados e só ver terra. Quando vejo o mar, sinto-me livre...e isso basta.

  1. O que procuras no Mar? E no Surf?

O que procuro no mar, é aquilo que ele próprio significa para mim, liberdade física, mas essencialmente espiritual. No surf procuro um caminho, um veículo para a minha própria felicidade, uma libertação da tirania do tempo. Uma maneira de envelhecer livre, feliz, tendo um prazer imenso em desfrutar do mar, da natureza, absorver toda a energia positiva que só a natureza no seu estado mais puro, pode oferecer. »

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